2020: o ano que prometia.
COVID19 expõe a desigualdade sanitária no Brasil e impactos nos investimentos.
Publicado em Lisboa, no site www.ambienteonline.pt em 26.03.2020
No dia 11 passado, escrevi o texto: “2020: o ano que promete?”, baseado nas expectativas de mudanças legais e institucionais no setor de saneamento básico. Afinal, alguns Estados e Municípios seguem buscando alternativas isoladamente ou com apoio do BNDES, o ambiente legal e posições do Governo Federal indicavam – ainda indicam – que mudar o modelo de prestação dos serviços de saneamento básico, é uma urgência.
Com a COVID19 alterando o presente e comprometendo o futuro fortemente, 2020 passa a ser o ano que prometia, sem nenhuma interrogação a fomentar pensamentos ilusórios. Os impactos na economia, são quase que imprevisíveis, mesmo que economistas e políticos apresentem projeções de todos os tipos.
A “marolinha” de 2008 nem de longe teve os efeitos que a “gripezinha” de 2019 trará com desemprego, falta de recursos e perdas financeiras para regiões onde investimentos significativos de curto, médio e longo prazos eram esperados. A COVID19, atestando o dia a dia nas cidades, capitais e regiões metropolitanas comprovou que o trabalho diuturno das Companhias Estaduais de Saneamento e o esforço que fazem desde 1985 quando ficaram entregues à própria sorte, não conseguiu, não consegue e não conseguirá fazer com que nas periferias de todas as capitais haja água e esgoto para todos.
A pandemia do coronavírus escancara a desigualdade sanitária urbana de São Paulo a Manaus. A falta de água nas periferias não é algo que as Companhias Estaduais tenham provocado sozinhas e pior, possam resolver isoladamente. Há anos se diz que algumas causas das torneiras secas estão no crescimento desordenado das cidades; na “desurbanização” planejada por medidas políticas de cunho local; na falta de integração entre planos diretores, de saneamento, de saúde pública e de investimentos e principalmente, na má gestão pública.
Na crise de energia da década de 70 no século XX, o Japão, limitado por condições naturais buscou alternativas na pesquisa e desenvolvimento de novas fontes de energia, tornando-se centro do desenvolvimento global dos sistemas solares fotovoltaicos graças ao papel do governo no financiamento de pesquisas e planejamento e definição de uma meta estratégica global. Grandes empresas japonesas se uniram em torno da meta global enquanto competiam entre si.
O Brasil possui grandes empresas publicas e privadas operando serviços de saneamento com capacidade financeira e organizacional para discutir técnica e economicamente o futuro dos serviços de saneamento básico? A realidade responde por si: sim. Um dos fatores que impede esta ação é sem dúvidas o modelo de gestão ainda vigente em muitas estatais, voltado para a manutenção/recuperação/criação de condições que só puderam fazer sentido na época do BNH/PLANASA, período onde houve, de certo modo, uma meta global.
Preocupa ver empresas estaduais cuja receita é menor que a despesa, com elevadas perdas de água e comerciais, sem capacidade de pagamento e/ou endividamento, sem contratos regulares com os municípios, sem capacidade de investir a curto, médio ou longo prazo e voltadas para a sustentação da prestação de serviços em muitos municípios apenas para perpetuar “espaços” eleitorais, reagirem contra mudanças e falarem de implantação de modelos de PPPs que não poderão jamais fazer. Assusta mais ainda ver que os municípios em geral tratam os serviços de saneamento como se fosse algo à parte de suas responsabilidade constitucionais e administrativas, como se a prestação dos serviços por uma empresa estadual do Governo do Estado não exigisse fiscalização, controle e regulação imparcial.
Para não ser definitivamente um ano perdido, com graves efeitos nos próximos, seria importante de fato que o Governo Federal assumisse uma meta nacional de melhoria da gestão, amparada no PLANSAB e legalmente fortalecida, para implementar mudanças em muitos Estados onde ainda se considera ser possível voltar ao passado.
Isto não significa acabar as Companhias Estaduais, antes de tudo seria torna-las administrativa e financeiramente capazes de gerenciar com eficiência o que assumirem. A regionalização prevista no PLS do marco regulatório pode ser um bom começo, desde que se observe sempre que o saneamento básico é uma serviço público ligado diretamente a vida das pessoas em cidades ou nas zonas rurais. Operado por privados ou públicos não funcionará sem gestão integrada das cidades, sem planos diretores, de saúde pública, de desenvolvimento econômico, de saneamento e sem regulação. O saneamento precisa ser racional!
Mario Baggio
26 de março de 2020 em 13:02Excelente como sempre, amigo. Que falta nos faz o saneamento básico, não?
Álvaro Menezes
26 de março de 2020 em 14:33Obrigado amigo. Pois é. Eu complementaria com: que falta nos faz a gestão competente dos serviços de saneamento básico. Abraços.
Suely
26 de março de 2020 em 15:16Excelente trabalho, o que já era de se esperar, vindo do sr., parabéns mais uma vez, admiro bastante a capacidade e inteligência pra gerir um excelente saneamento básico para nós.
Álvaro Menezes
26 de março de 2020 em 19:41Obrigado Suely.Abraços.
Waldeck Stevens de V Egito
26 de março de 2020 em 18:22Parabéns Alvaro!
Maior clareza impossível. Bela análise! Abraços
Álvaro Menezes
26 de março de 2020 em 19:42Obrigado amigo. Abraços.
Mário Ronalsa Brandão filho
29 de março de 2020 em 19:14Meu amigo Álvaro, mais um excelente artigo!
Parabéns!!!!
Álvaro Menezes
30 de março de 2020 em 10:45Obrigado amigo Mário. Abraços.
Marlon do Nascimento Barbosa
30 de março de 2020 em 09:23Prezado Amigo Álvaro! Parabéns pelo brilhante artigo. Se cada um (titular, prestador e regulador) fizer o seu papel, toda a sociedade ganhará, sem dúvida!
Álvaro Menezes
30 de março de 2020 em 10:45Obrigado mais uma vez caro amigo, pelo comentário.
Abraços.
GEOBERTO ESPÍRITO SANTO
31 de março de 2020 em 12:08Caro Álvaro
As crises sempre nos mostraram também novas oportunidades, novos caminhos a serem trilhados. Estatal ou privado, depois da coronavírus (antes já devia ter sido assim) o que vai precisar é gestão competente. Mas essa crise tem que mudar, além da cabeça e ações dos gestores, a cabeça dos nossos políticos, empresários e corporativismo assoberbado.
Vamos ver o que acontece, se a gente toma jeito, se a gente vai continuar passando em nossos veículos ignorando os moradores de rua e as crianças nos sinais de trânsito, fora das bancas escolares.
Parabenizo-o pela racionalidade de sempre.
Abraço (pela internet pode)do
Geoberto Espírito Santo
Álvaro Menezes
1 de abril de 2020 em 21:05Amigo Geoberto.
Obrigado pelos pertinente comentários.
Seus artigos também sempre trazem inspiração.
Abraços.
walder suriani
31 de março de 2020 em 20:08Prezado Álvaro,
Lúcido o seu artigo. Vc levanta problemas existentes no saneamento desde a década de 80. É incrível como mais de 30 anos depois ainda estamos discutindo como sair dessa situaçao. Pior, depois da soluçao a ser encontrada e implementada, teremos mais algumas décadas para ter os resultados esperados. E nem precisa de ajuda dos Covid da vida…..
Álvaro Menezes
1 de abril de 2020 em 21:07Obrigado Wálder.
Realmente o setor de saneamento difere muito do de energia, exatamente por sua adequação à mesmice. Pouco muda e só se enxerga mudanças se houver investimentos milionários.
Abraços.
João Marques
31 de março de 2020 em 22:15Muito bom seu artigo. Saludos.
Álvaro Menezes
1 de abril de 2020 em 21:07Obrigado amigo.
Abraços.
Aleksander Rocha
7 de abril de 2020 em 00:54Muito bom o artigo que realmente mostra a nossa realidade diante do mundo e, principalmente, nesse momento triste em que passamos com essa pandemia.
O nosso país precisa urgentemente de políticos e gestores competentes para, em médio e longo prazo (era esperado de curto e médio praz mas, não ocorrerá infelizmente) tenham a capacidade estratégica e profissional de reinventar e de se reinventar diante dessa crise pois temos muito a oferecer mas, com mudanças radicais que evoluam o patamar do país no ramo do saneamento e esgotamento (um dos alicerces para a saúde e bem-estar da população).
Belo texto Álvaro e muito racional. Parabéns, abraços fraternos.
Álvaro Menezes
7 de abril de 2020 em 08:44Origado Aleksander. Comentários importantes sobre o tema são necessários.
Abraços.