Décadas de atraso, décadas de avanço.

Desde de 2020, os anos passaram como se décadas estivessem passando no setor de saneamento para compensar atrasos.

O ano de 2023, como outros em que ocorreu a mudança de Governo Federal, iniciou pleno de expectativas e receios de que o setor de saneamento seja novamente atingido por período de indefinições – ou definições – as quais, ao invés de promover avanços provoquem atrasos. O centro das atenções, como mencionado em textos anteriores, é a possibilidade de reformas e revogações no processo iniciado como o novo marco regulatório em 2020.

Fica repetitivo, mas como já mencionado em textos anteriores, o chamado novo marco regulatório trouxe uma movimentação salutar para o setor de saneamento como há muito não se via. Parafraseando Lenin, passaram-se algumas décadas sem muitas mudanças e avanços, porém desde 2020, cada ano trouxe avanços de décadas. Pode parecer exagero, porém alguns pontos são indicativos de que houve avanços sim, tais como:

  • Definição de metas de universalização para 2033 com modelos de gestão e investimentos que tendem a fazer estas metas serem alcançadas;
  • Volume de investimentos até 2033, embora não seja para 100% do Brasil, já é o maior dos últimos 20 anos;
  • Companhias estaduais de saneamento se movimentam em busca de mostrar sustentabilidade financeira para prestação dos serviços, com clara visão de mudanças em seus modelos de gestão e cultura gerencial;
  • Municípios buscam soluções com parceiros privados, independente do assédio dos gestores públicos estaduais com propostas  em troca de outorgas milionárias;
  • Inserção da ANA no processo de regulação da prestação dos serviços, ainda que apenas para produzir normas de referência.

O fato é que hoje há um processo muito objetivo de busca pela melhoria da qualidade dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, com possibilidades de melhorias também na área de resíduos sólidos. Faltam entretanto medidas mais efetivas nas áreas de drenagem urbana e saneamento rural.

É claro que não se pode fazer tudo de uma vez, nem tão pouco imaginar, como parecia ser o anunciado no Governo anterior, que a participação do setor privado em concessões e PPPs é a panaceia salvadora para os déficits financeiros e de gestão no setor de saneamento.

As possíveis décadas de avanço que o novo marco regulatório indica poderem se tornar realidade nos últimos dois anos e meio de sua vigência, não podem se pautar apenas pelo compromisso de investimentos que os contratos já firmados indicam ou pela perigosa utilização da outorga onerosa como moeda de troca para obtenção das concessões.

Respeitosamente, ousando sugerir algo ao novo Governo Federal, é necessário resgatar o papel do poder público na gestão das políticas públicas, fiscalização, controle e regulação dos serviços de saneamento, para que os operadores públicos e privados cumpram suas metas e produzam resultados que sejam realmente parametrizados por tarifas módicas, ao invés de serem beneficiados com reajustes tarifários.

O desafio de criar soluções de gestão com investimentos para drenagem urbana e saneamento rural, se acrescenta ao desafio que pauta os serviços de água e esgoto há anos, que é ter um subsídio real que permita a prestação do serviços para todos sem desequilíbrio do contrato do operador privado ou público. A tarifa social praticada nos serviços de água e esgoto não cumpre tal papel e tende a ser uma boa relógio nos novos contratos em razão de estimativas inexplicáveis para a quantidade de seus usuários, completamente diferente da quantidade de tarifa social no setor de distribuição de energia elétrica.

Assim, não parece justo dizer que cabe aos prestadores dos serviços, sejam eles privados ou públicos, a execução de políticas públicas e “ações sociais”, sem que os Governos Federal, Estadual e Municipal, no âmbito de suas competências, se integrem para apoiar o modelo mais sustentável em termos sociais, técnicos, econômicos, ambientais e políticos, de modo que os prestadores de serviços possam executar as politicas públicas e sociais com sustentabilidade financeira e sem onerar a sociedade.

6 Comentários em “Décadas de atraso, décadas de avanço.

Sérgio Murilo
23 de janeiro de 2023 em 13:37

Excelente reflexão.

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Álvaro Menezes
26 de janeiro de 2023 em 18:22

Obrigado amigo.

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Mário Augusto Bággio
24 de janeiro de 2023 em 13:05

Amigo Álvaro, qual a sua visão para o destino da ANA, ao meu juízo, entidade importante na regulamentação do Setor? Vc acredita em outro Órgão que possa substitui-lá?

Abraços e parabéns pela abordagem sempre bem contextualizada

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Álvaro Menezes
26 de janeiro de 2023 em 18:22

Olá amigo Bággio, obrigado.
Pelo que vejo a ANA seguirá com a elaboração das normas de referência, o que acho pouco para uma entidade como a ANA e um setor com deficiências regulatórias. Espero que a ANA possa ter um papel mais relevante que só fazer normas de referência não impositivas.

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Alberto Salazar
25 de janeiro de 2023 em 14:04

Olá Álvaro,
Mais uma vez uma perfeita análise atualizada do tema do Saneamento.
Abraços.

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Álvaro Menezes
26 de janeiro de 2023 em 18:19

Olá amigo Salazar, obrigado por ler e comentar. Abraços.

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